Iara
o peixe suicida
Dia de vida comum, naves lançadas ao mar
De pescadores impiedosos, outros apenas famintos
E abraços de redes indiferentes, véus que arrastam vidas
Numa fumaça cinza e confusa
De areia, sal e água
Conchas fechadas, conchas abertas
Pérolas perdidas
Sereias descabeladas
Escamas desparelhadas
Cardumes descoloridos
Peixes grandes, os cobiçados
Fecham saídas com seus corpos inertes e olhos parados
Peixes pequenos, desafortunados, presos nesse emaranhado
Sem perceber são levados junto a corpos indefinidos,
Uns rígidos, frios, outros tenros e ainda agonizantes,
Estranhos e irreconhecíveis, ali jaz algo na praia
E do mar a vê-los perplexo
O peixe suicida
Que na rede por vezes entrara e saíra
Aguarda por novo abraço
Sem de fato saber o porquê
Talvez pelo costume ao perigo, ou o amor ao sofrer
Talvez pela simples natureza de suas escamas,
Talvez pela vergonha do seu colorido enquanto fora,
Talvez pelo medo de não haver colorido algum...